Democracia à moda Saddam?!
Evidente que num regime bruto de exceção além de ser obrigado a votar o cidadão não tem a segurança sobre o sigilo do seu voto, e sabe que pode sofrer represália se não votar no nome “certo”, aquele que é previamente escolhido para governar. Então lá no Iraque havia uma escolha prévia por Saddam, e os cidadãos tinham que ir até a urna validar isto. Já aqui nós temos uma segurança sobre o sigilo do nosso voto, e este seria o segundo ponto que nos diferenciaria dos iraquianos.
No caso da democracia ‘complicada e perfeitinha’ dos EUA, as opções de escolha são mínimas apenas na reta final de uma campanha. Até então, dezenas e até centenas de candidatos participam, em um sistema que para nós parece complicado. O interessante é que no fim, quando dois candidatos disputam, os dois nomes são visivelmente diferentes em praticamente tudo, do discurso político até as propostas de solução para os problemas enfrentados pelos cidadãos norte-americanos. De fato, o norte-americano tem condições plenas de analisar entre diversas opções de escolha, e decidir entre duas boas propostas qual escolher. Outro detalhe é que tudo isto ocorre em um regime completamente livre, onde no dia da eleição sequer é feriado. O norte-americano politizado vai à urna por acreditar no nome que escolheu e por fazer questão de participar. Ah, e pra deixar o registro, se quiser o norte-americano também pode anular o voto.
A garantia do seu direito lhe obriga a participar na marra
Entendendo a obrigatoriedade como uma forma de assegurar que todo cidadão participe de uma eleição estamos agindo como tolos, porque a obrigatoriedade de votar é uma imposição apenas e não passa disto. Se queremos garantir o direito pleno ao voto podemos fazer isto sem necessariamente obrigar todos a irem à urna votar. Basta continuar com o que estamos fazendo a cada eleição e basta também mudar uma regrinha, permitindo que o cidadão decida por si se sairá de casa num belo Domingo de sol e passará numa cabine de votação, ou se vai preferir ficar em casa e acompanhar a decisão do campeonato de F1, comemorando o título da Ferrari no resto do dia.
Enquanto a incômoda obrigação existir, haverá duas coisas. A primeira é o ‘voto-por-votar’, assim sem nenhum cuidado com o ato e seguido por uma dor de cabeça de quatro anos pela frente, com o agravamento de um câncer político maligno que pode durar décadas e, em metástase, atingir até o congresso nacional. A segunda é uma desvalorização monetária do voto, que, como qualquer mercadoria, é comercializado e seríamos tontos de acreditar que isto não existe.
O negócio da compra e venda de votos é viável econômica-politicamente porque o voto é uma mercadoria barata para quem vende, e valiosa para quem compra. Então com poucos recursos investidos um pilantra político consegue um retorno grande, poder e mais possibilidades de investimentos. É assim que apodrecemos Brasília, pequenos mercadores de votos, comprando a preço de banana votos em favelas reuniram, ao longo de cargos menores, recursos que investiram em cargos maiores até chegarem ao poder no Planalto Central. Quem vende o voto não vê perspectivas nas escolhas, prefere o benefício material/financeiro imediato já que seu voto – em seu entendimento – não pode mudar a realidade em que vive. A maioria destas pessoas não participaria de uma eleição até que um candidato realmente capaz de satisfazê-las surgisse, mas são obrigadas a irem de qualquer forma a uma cabine de votação, com muitas dúvidas e uma certeza, a de que continuará onde sempre esteve.
Para o cidadão é difícil acreditar que um voto – que é exatamente o que ele representa no quadro político até este momento – tenha algum valor, então quando ele se vê sem opção, troca por qualquer coisa mesmo. A obrigação de ir a uma urna, para quem nem entende direito quais as tarefas de um vereador, faz com que pessoas votem como se estivessem participando de uma enquete para reallity shows da TV. E tem gente que transforma campanha eleitoral em gincana, com torcedores no lugar de eleitores.
Enfim, na maioria votamos por qualquer motivo, movidos pela obrigatoriedade, mas poucos dos que vão a uma urna votam com consciência do que fazem e acompanham a política com olhos de raio-x. Os absurdos políticos são percebidos pelos cidadãos que reuniram ao longo da vida uma gama de informação e não foram alienados pelos meios utilizados por aqueles que controlam a sociedade, via controle remoto, diga-se. Esta minoria nunca abriu mão de votar, não costuma anular o voto e jamais errou um voto. Em contraste com a realidade, poucas vezes votou em um político que tenha sido eleito no final da contagem, já que uma massa de pessoas, perdidas em desinformação e embebidas em novelas políticas e shows diversos, entrou na cabine de votação, levadas pela obrigatoriedade, e decidiu votar por um motivo fútil.
Não é o voto obrigatório o responsável pela destruição social e política em nosso país, não se trata de transformar este infame ser em um ‘bode expiatório’, e não será com o voto facultativo que vamos solucionar tudo em uma tacada só. Mas o voto obrigatório é uma é uma engrenagem dentro da máquina politiqueira no Brasil, e deve ser extinto numa série de atitudes acompanhadas de uma reforma política e medidas educacionais que ensinem princípios de cidadania desde as séries iniciais do ensino fundamental. Então é um passo no sentido correto, apenas um passo, mas um passo importante que precisa ser dado e será inevitável. A menos que optemos por continuarmos imersos em hipocrisia.
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