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Sobre Moralismo, Polêmicas, Censura e o MBL de Gaiato no Navio

Escrito por William Santos | terça-feira, 12 de setembro de 2017 | 23:47

Com relação a polêmica "exposição de artes da discórdia", não considero que o MBL tenha censurado coisa alguma. A acusação forçada sobre o grupo tem sido muito bem aproveitada por eles mesmos, reforçando entre seus apoiadores a ideia de que possuem realmente algum poder. Na verdade, não é bem isso. A tentativa de manipulação, colocando o MBL como censor, o que confrontaria o “movimento” com seu lema liberal, também tem sido facilmente rebatida pelo grupo que, colocando as coisas no devido lugar, mostra ter sido responsável apenas por uma campanha de boicote. Esta campanha sim um tanto infame e bastante exagerada (ao melhor estilo MBL), porém longe de ser um ato de censura. De qualquer forma, nesta discussão toda que se segue, o que se vê de fato é um isolamento entre grupos. Cada um fala pra si, cada um se aproveita da bagunça toda para autopromoções. No entanto, nenhum destes grupos políticos/ideológicos/o que quer que sejam são os reais responsáveis pela coisa toda que se viu ai nestes últimos dias com a exposição bancada por aquele banco lá que todo mundo sabe qual é (e por que eu teria que fazer mais campanha pra banco aqui, né?)

O que aconteceu com a tal exposição de arte afinal

Na minha opinião, a resposta não começa nos atos do MBL e passa muito ao largo da capacidade de um movimento político qualquer em forçar a retirada de conteúdo de uma exposição. Ao que me parece, a coisa tem mais a ver com os "novos tempos" mesmo. É mais uma questão de acesso amplo a informação, do fácil compartilhamento, e da ampla difusão de opiniões. Décadas atrás, a mesma exposição ocorreria e seria pouco provável que fosse cancelada. Com repercussão polêmica, sim, certamente, mas não a ponto de provocar uma ação rápida de sua retirada.

As coisas mais torpes costumavam acontecer meio escondidas do grande público. As classificações (incluindo as de faixa etária) já bastavam para uma triagem do público. O que não garantia que alguns não se chocassem com aquilo que viam, mas no fim os impactos ficavam contidos e não atingiam com tamanha força aqueles que não tivessem participado diretamente dos eventos (exposições, shows, exibições, etc.)

Pra ser mais preciso em relação ao que quero dizer, basta observar que revistas “adultas” estiveram ai até mesmo no período da censura militar. Eram classificadas e ponto. Sem espaço para grandes manifestações contrárias. Bastava o bom senso de observar que comprava quem quisesse, pois já estavam avisados de seu conteúdo. Claro que nudez é algo leve se comparado com provocações mais extremas, como aquelas que envolvem religião. Mas isto não significa que as crenças religiosas tenham sido sempre poupadas. Inclusive o debate sobre o politicamente correto não é algo novo. A força destes debates, sim se ampliaram muito deste a popularização da rede mundial de computadores. E é ai onde começam os problemas com a tal exposição polêmica vista agora.

Voltando ao caso das revistas, quem tem uma noção extremamente superficial da coisa, pode enxergar o que está em suas páginas como algo criminoso (atentado ao pudor!). Assim como a tal ‘profanação’ vista na atual exposição faz parecer que algum crime está sendo cometido contra crenças alheias. No entanto, entendemos bem que: Uma coisa é promover nudez em via pública, outra, bem diferente, é fazer isto de acordo com normas acordadas e aceitas socialmente. Nas páginas das revistas, as imagens estavam apenas para aqueles que aceitavam vê-las. Óbvio, não há crime nisso. Assim como na exposição, só quem aceita aquele tipo de arte, e estando devidamente avisado sobre o teor da exposição, decide apreciá-la. Claro que os críticos tem seu espaço também nisso. O que acontece, de fato, é que quem repudia a nudez das revistas masculinas não as compra e tem seu direito garantido de se manifestar contra elas. Porém, nunca proibir que sejam vendidas, ou forçar sua retirada das bancas. Tal como no caso da exposição.

Mas por que o banco, que promovia a mostra, a retirou

Neste caso, acredito que a polêmica foi analisada pela empresa como desfavorável à sua marca. E este é o problema principal. Em busca de preservar tal marca, o banco tomou a decisão de retirar seu apoio daquela mostra. No entanto, observo que este efeito é fruto do que temos no mundo recente, da popularização da Internet e do amplo acesso a tudo. Em instantes, o que era pra ser uma exposição fechada, restrita ao público que decidiu apreciá-la, tomou a rede e foi parar nos dispositivos de milhares de outras pessoas para as quais aquela mostra não havia sido elaborada. Evidentemente que a reação seria a que se vê hoje. E também é fácil deduzir que a empresa apoiadora precisava reagir a isto. É como se uma publicação erótica qualquer, capaz de chocar um determinado público, fosse divulgada de forma alarmante nas redes sociais. O efeito é sempre o mesmo. E assim será daqui por diante inclusive.

Moralismo contido

Volto a algumas décadas no passado pra entender um pouco mais sobre o que se tinha em idos das décadas de 1980 e 1990. Se pesquisar rapidamente sobre a TV aberta no nosso país nestes períodos pre-internet, verá nudez, piadas com minorias, profanações de todos os tipos e um monte de coisas de gosto duvidoso sendo exibido. Havia aceitação a tudo isso e, de repente, as coisas mudaram? A resposta é um gigantesco não! Não mudamos tanto assim em um espaço de uma década ou uma década e meia (considerando ai a crescente popularização das redes sociais). Somos basicamente os mesmos de 1980 e 1990, que assistiam nudez e sacanagem disfarçada de entretenimento nos programas de auditório dominicais (feitos para entreter famílias). O conservadorismo estava lá sim, resmungando no sofá da sala e alcançando eco nas conversas entre vizinhos, no trampo, na escola… Mas não passava disso. E, no final das contas, as polêmicas até ajudavam a promover tais apelos. É mais fácil agradar pervertidos do que produzir coisas de qualidade que atraiam público. Simples lógica que vale até os dias de hoje, seja pra TV, seja pra própria web e até mesmo para os perfis em redes sociais. Sempre partimos pra algum tipo de apelação. Às vezes até acredito que reproduzimos o que aprendemos com a TV quando buscamos por atenção (sangue, vísceras, violência gratuita, nudez e sexo. Coisas que sempre funcionam em qualquer postagem).

Pequena coletânea do canal Nerd Show sobre o assunto:







Ao que parece, mais uma vez, estamos diante do conhecido efeito da grande rede sobre a privacidade. Neste caso, a “privacidade de uma mostra de arte” foi por água abaixo quando alguém resolveu expôr sua opinião, assim como sempre fizemos sobre as telenovelas, humorísticos e concursos de bundas dominicais em nosso passado não muito distante. Só que desta vez a coisa não estava sendo compartilhada em rodinhas de amigos da firma, da escola ou da vizinhança.

Captura de tela do filme: O Círculo. A produção aborda muitas coisas relacionadas a comportamentos
comuns em redes sociais e suas consequências. Em um dos casos, um simples e inocente
compartilhamento causa terríveis problemas a terceiros envolvidos.
Onde entra o MBL nisso


Assim como outros grupos, tanto conservadores quanto os que se opõem ao conservadorismo, este pessoal entra de gaiato nestes fatos e vão faturando com a coisa toda a medida em que as dimensões de tais polêmicas se ampliam. Não consigo ver o MBL como protagonista de nada (isto inclui o impeachment recente), mas que o grupo se aproveita bem destas coisas, isto é indiscutível. E não se trata nem do trabalho deles em busca de promoção, mas em muitos casos, são os detratores do MBL quem os promove ao atacá-los de todas as formas, sem avaliar bem o que está acontecendo de fato. O movimento é acusado de praticar censura tendo feito não mais do que qualquer resmungão sempre faz nas redes sociais: compartilhar indignação em nome do sagrado conservadorismo.

Lições

Podem ser muitas as lições, mas uma delas é bem nítida: O senso de privacidade mudou tanto que hoje não basta mais apenas classificar as coisas pra impedir que elas atinjam quem não deveria ser afetado por determinados conteúdos. Por exemplo: Antes o sujeito mostrava uma carteira de identidade, comprovando ser de maior, e entrava numa sala de cinema pra assistir coisas bizarras. Todos na sessão sabiam do que se tratava e poucos corriam o risco de se indignar com algo ali. Mas nos dias atuais, qualquer um pode simplesmente compartilhar tal sessão de cinema quase instantâneamente. Dai, quem nunca iria até aquilo lá acaba recebendo tal conteúdo e o trata como algo veiculado publicamente, sem qualquer filtro, totalmente exposto. Eis então que começa a gritaria. É por ai onde se começa a confusão entre o que deveria ser aceito ou não aceito, tolerado e não tolerado, por ai vai. Sem pensar em nenhum segundo se houve os tradicionais cuidados dos organizadores para não atingir diretamente quem não se sinta a vontade com tal exibição. O que torna os ‘compartilhadores’ os verdadeiros responsáveis pelo fuzuê todo.

Sobre a exposição em si, o que eu acho é que ela não me atinge. Simples: Eu não achei legal não. E simplesmente não iria a uma exposição destas, nem naquele espetáculo “Macaquinhos”, ou algo do gênero. Porém, não faria nenhum boicote ao banco que a promove, ou instituições. O banco não está me obrigando a nada. Eu não tenho que ver as obras pra usar os serviços da empresa. Por mim, tanto faz. Tem pedofilia, tem zoofilia, tem agressão aos cristãos?! Não vi naquilo uma campanha por nada disso. Não sou entendedor de artes, nem crítico nem nada, mas sou esperto o suficiente pra considerar que se telas e esculturas (ou seja lá mais o que for exposto) causa algum impacto, isto leva a alguma reflexão. Posso reprovar tudo, a arte permite isto, às vezes ela provoca exatamente isto inclusive. Em muitas campanhas publicitárias este recurso até é utilizado. A polêmica é um recurso utilizado há muito tempo. E aqui, tenho recebido visitas no meu blog justamente por abordar esta polêmica. Ou seja, mesmo eu estou me beneficiando disto tudo, vejam só.

E o Kiko?!

No mais: enquanto eu tiver meu direito a ignorar o que não me convém, tá tudo certo. Aquela exposição não me afeta em nada. Não afeta a sociedade coisa nenhuma. É só uma exposição de artes, nada com o que nos preocupar. Não vão levar aquilo para dentro de igrejas, não estão estampando nada em outdoors, não será veiculado em tardes de Domingo, nos principais canais da TV aberta. Não chegamos a este ponto ainda.
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